Faleceu na madrugada desta quinta-feira no estado de São
Paulo, o engenheiro ambiental, cantor, compositor e multi-instrumentista maranhense,
José de Ribamar Viana, ‘Papete’, vítima
de um câncer na próstata.
Papete que foi revelado ao Brasil e ao mundo pelo legendário
‘selo “Discos Marcus Pereira” — um selo independente de música regional e
música popular brasileira do produtor musical e pesquisador, Marcus
Pereira que fazia um trabalho voltado para a valorização e divulgação da música
regional.
Sobre Papete
escreveu Juarez Duarte Bomfim do JORNAL GRANDE BAHIA
Publicado
em 13 de março de 2016
Papete
Viana e o Tambor de Crioula
Peço a
todos os Santos, Orixás e Voduns dessa enorme Encantaria que é o Maranhão para
proteger e preservar os sons mágicos e envolventes de seus tambores e
tambozeiros, especialmente a saúde do Amigo Papete Viana, para que ele continue
a alegrar as nossas vidas com sua maviosa arte.
Em
viagens pelas plagas maranhenses, no ano de 2015, tive a grande satisfação de
conhecer e privar da amizade de um ilustre maranhense, uma lenda, um mito da
Musica Popular Brasileira: o percussionista, compositor, cantor e pesquisador
Papete Viana.
(Como bom
maranhense, Papete tem como nome de pia José de Ribamar, mas ele alerta que
termina por aí a coincidência com um conhecido homônimo conterrâneo…)
Papete
dispensa apresentações. Eleito, nos anos 1980, o melhor percussionista do globo
terrestre, ele é figura marcante no cenário cultural brasileiro. A sua produção
artística começou a ser divulgada no legendário ‘selo “Discos Marcus Pereira” —
um selo independente de música regional e música popular brasileira — e
continua profícua ao longo de mais de quatro décadas.
O
“Dicionário Cravo Alvim da Música Popular Brasileira” registra que Papete foi
músico em shows de Toquinho e Vinicius de Moraes e, com o falecimento do
‘Poetinha Camarada’ continuou a acompanhar Toquinho em 482 shows, em turnê por
18 países.
Papete
atuou em shows e gravações com Rosinha de Valença, Marília Medalha, Hermeto
Pascoal, Osvaldinho da Cuíca, Benito de Paula, Inezita Barroso, Diana Pequeno,
Renato Teixeira, Almir Sater, César Camargo Mariano, Rita Lee, Sadao Watanabe,
Ângelo Branduardi, Andreas Wollenweider, Ornella Vanone e Alex Acuña.
Todavia,
quero destacar aqui a dimensão humana desta celebridade: gentil, cortês, cativante,
solícito e amigo.
Naqueles
dias do sempiterno verão maranhense, conversamos sobre tudo, e Papete me deu
uma iniciação básica do que é o Maranhão e a sua capital, esta grande e caliente
urbe nordestina da qual ele é a sua mais completa tradução.
Papete é
um bom gourmet, e ao saber que era nossa primeira incursão naquele rincão
nordestino — este que vos escreve e, claro, a minha muito amada Cecília —
nos deu um minucioso roteiro gastronômico da rica e variada culinária lá
da ‘Ilha do Amor’ — como uma amiga grávida e de bem com a vida denominou aquela
encantadora Cidade.
Pois
vamos lá. Provei do ‘Arroz de Cuxá’ após Papete recitar a receita do refogado.
O refogado é uma das principais técnicas da culinária que os portugueses
espalharam pelo mundo, durante o processo de colonização.
— Doure a
cebola e depois coloque o tomate, o pimentão e o camarão seco. Deixe fritar por
uns cinco minutos; adicione a vinagreira, que deve estar batida ou cortada na
faca. Acrescente o leite de coco, o gergelim torrado e, por último, misture ao
arroz já previamente cozido. Bom apetite!
Provado e
aprovado.
Quando
soube que visitaríamos o Santuário religioso de São José de Ribamar, Papete
exclamou:
— Comam
peixe-pedra!
O
apetitoso pescado recebeu este nome porque costuma se esconder dos ardilosos
pescadores no fundo do mar, por entre as locas e pedras das águas escuras do
litoral daquela mística Cidade, guarnecida pelo ‘Santo de Botas’: São José do
Arribamar.
E por
falar em peixe, já que se trata de uma Ilha, o músico maranhense recomendou
almoçar um apetitoso robalo no Restaurante de Dona Roxa no Mercado Municipal,
Centro Histórico de São Luís… Dona Roxa já não se encontra neste mundo,
encantou-se. Porém, fomos bem recebidos por sua filha e sucessora na arte
culinária, Dona Roxinha — e netas.
Tem mais:
de sobremesa sorvemos a Jussara… Não, Jussara não é uma jovem e graciosa
“ludovicense” — estranho nome que se dá aos nativos de São Luís… Jussara é o
sinônimo que se usa para a deliciosa fruta açaí…
Na Cidade
Histórica de Alcântara, Papete recomendou:
— Não
deixem de provar o “Doce de Espécies de Alcântara”.
Feito!
Em
badalado e sofisticado restaurante praieiro de São Luís, já apreensivos de
subir em balança de farmácia, comemos apetitosa ‘Carne de Sol de Carneiro’,
ótima dica do célebre Amigo.
O melhor
ainda estava por vir… e fomos lá. Os notívagos e boêmios “ludovicenses”
costumam terminar a longa noite de folguedos fazendo refeição nos inúmeros trailers
que se espalham pelas calçadas e praças de São Luís. Nestes botecos improvisados,
famoso é o “Arroz de Papete” — cuja receita é um mistério guardado a sete
chaves. Visite São Luís e conhecerás.
Livro-álbum
“Os senhores cantadores, amos e poetas do bumba-meu-boi do Maranhão”
Nos
últimos anos, Papete Viana esteve empenhado na realização de um extraordinário
Projeto Cultural intitulado “Os senhores cantadores, amos e poetas do
bumba-meu-boi do Maranhão”, voltado ao registro, resgate e preservação da
memória da maior manifestação cultural do Maranhão através de seus personagens
principais que dão titulo ao trabalho.
O Projeto
se tornou uma das mais importantes missões da vida do artista: resgatar a vida
e a obra desses anônimos cantadores. O trabalho de pesquisa resultou no
livro-álbum “Os senhores cantadores, amos e poetas do bumba-meu-boi do
Maranhão”, que possui fotos, textos de pesquisadores, um resumo sobre a obra
dos cantadores de acordo com o sotaque e um glossário com termos usados na
brincadeira, e vem acompanhado de DVDs com entrevistas dos cantadores e um CD
com toadas que marcaram época.
O mítico
e mágico universo da Encantaria do Maranhão
Nestes
dias de longas conversações, o Amigo Papete Viana iniciou-me no mágico e
místico universo da Encantaria Maranhense e as histórias do Tambor de Mina, com
suas extraordinárias deidades e entidades da cultura e religiosidade europeia,
africana e ameríndia.
No
Maranhão circulam várias narrativas relacionadas ao mito do Navio Encantado de
Dom Sebastião, que é visto pelos viajantes no local conhecido como Boqueirão,
no Golfão Maranhense. Há também a lenda do Navio Encantado de Dom João, que
era visto pelos frequentadores do antigo Terreiro do Egito (Tambor de Mina) no
local próximo ao Porto do Itaqui em São Luís. Há igualmente o mito da Princesa
Iná, filha do rei Dom Sebastião, que ficou revoltada quando seu Palácio, no
fundo do mar, foi perturbado pela construção do Porto do Itaqui.
Papete
narrou-me a surpreendente e misteriosa história de que, durante a construção do
Porto do Itaqui, em São Luís, aconteceram diversos acidentes graves e alguns
escafandristas morreram.
Pais-de-santo
do Tambor de Mina divulgaram a notícia que o Porto era o local da Encantaria da
Princesa Iná, filha do rei Dom Sebastião e que a Princesa estava revoltada,
pois seu Palácio, no fundo do mar, fora perturbado pelas obras e por isso
escafandristas estavam morrendo.
Para
acalmar a ira da Princesa, aqueles religiosos prometeram oferecer sacrifícios e
organizar uma grande festa, reunindo representantes de diversos terreiros na
Praia do Boqueirão, próximo ao local. Foi o que ocorreu em 1970, com ampla
repercussão na mídia e apoio de autoridades municipais — que foi muito
divulgado na época.
Depois
disso não ocorreram mais acidentes na construção do Porto. Entretanto, alguns
pais-de-santo dizem que, de tempos em tempos, as oferendas precisam ser
renovadas para evitar futuros problemas entre o mundo dos vivos e os vigilantes
Encantados maranhenses…
Finalizando,
eu peço a todos os Santos, Orixás e Voduns dessa enorme Encantaria que é o
Maranhão para proteger e preservar os sons mágicos e envolventes de seus
tambores e tambozeiros, especialmente a saúde do Amigo Papete Viana, para que
ele continue a alegrar as nossas vidas com sua maviosa arte.
“Observar
sempre, aprender com quem sabe mais, pesquisar sempre, conhecer a alma das
pessoas humildes, entender o mar, apreciar as chapadas e traduzir as nuvens”
(Papete Viana).
Trajetória
Bandeira de Aço: o disco que consagrou Papete
Papete nasceu em Bacabal – a 240 km de distância da capital –, e é uma das principais referências do São João do Maranhão, com canções e composições que marcaram gerações, como ‘Bela Mocidade’, ‘Boi da Lua’ e ‘Coxinho’. Seu trabalho mais destacado é ‘Bandeira de Aço’.
Papete foi reconhecido um dos melhores percussionistas do mundo, nos anos de 1982, 1984 e 1987, quando participou do ‘Festival de Jazz de Montreux’, na Suíça.
Mais recentemente, o cantor e compositor lançou um trabalho intitulado, ‘Os senhores Cantadores, Amos e Poetas do Bumba Meu Boi do Maranhão’, que resgata a história dos cantadores de bumba meu boi do Maranhão. Com blog Maranhão Maravilha
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