por Djamila Ribeiro*
Com o golpe, os grupos
historicamente discriminados serão vistos pela ótica do descaso. Não há
negociação possível com o governo ilegítimo
Algumas
ações do governo interino já sinalizavam retrocessos no campo dos direitos
humanos e no que diz respeito a avanços obtidos nos últimos anos para grupos
historicamente discriminados.
Independente
das críticas que se podem ter ao governo da presidenta Dilma, estamos
assistindo a um golpe com cunho machista e misógino. É assustador saber que
reivindicações históricas das mulheres seguirão sem visibilidade, e os poucos
avanços obtidos cortados.
É
necessário perceber a impossibilidade de se dialogar com o governo do golpe.
São perspectivas radicalmente diferentes. Se, com todas as falhas do governo
Dilma, existiram conquistas para a população negra, como a lei de cotas para o
serviço público federal, no governo interino a Secretaria de Políticas de
Promoção da Igualdade Racial sequer existe mais. Onde antes se dialogava e
pensava medidas de inclusão, agora será a perspectiva da aniquilação, da
desimportância.
As ações
serão no sentido de manter os lugares construídos por uma sociedade machista e
racista. Mulheres podendo ser até belas, recatadas e do lar, mas não agentes de
mudança e ocupando espaços de poder. Da população negra limpando, mas não
sentando nos banco da universidade. Da manutenção das mulheres negras dentro de
uma lógica escravista. É como se eles dissessem: “vocês já viram demais”.
Obviamente
que ainda existia muito a ser feito pelo governo eleito democraticamente.
Mudanças e um olhar mais progressista também se faziam necessários. Mas a luta
deve ser pela ampliação dos direitos, e não pela redução. Havia ali a
possibilidade da crítica, de apontar os limites, da pressão para um caminho que
atendesse as demandas dos movimentos sociais. Ao menos podíamos existir como
sujeitos do contraponto.
Após a
efetivação do golpe, não nos resta opção a não ser o enfrentamento. Os grupos
historicamente discriminados serão vistos pela ótica do descaso. Já sabemos o
que esperar. A ação deve ser no sentido da não negociação com a ilegitimidade e
do repúdio ao aviltamento a nossa humanidade. Este texto foi publicado
originalmente na revista Carta Capital
*Djamila Ribeiro é pesquisadora na área de
Filosofia Política e feminista. É secretária-adjunta da Secretaria de Direitos
Humanos e Cidadania de São Paulo
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