sexta-feira, 5 de julho de 2019

A poesia segundo José Chagas

Maré Memória
I
Olhe aí a palafita
crescendo sobre a maré.
O homem que nela habita
caranguejo ou peixe é.
Caranguejo que se irmana
com os bichos dos lamaçais,
na condição desumana
de caminhar para trás,
de voltar à pré-história,
– vergonhosa marcha à ré –
e afogar sua memória
no ir e vir da maré.
Peixe caído na rede
que a vida lançou ao mangue,
para matar fome e sede
de um mundo nutrido em sangue.
Caranguejo ou peixe, o fato
é que o homem posto na lama
não sabe o seu nome exato
e também ninguém o chama,
nem o batiza de novo
com esse sal de maré.
Não se sabe de que povo
nem de que raça ele é,
ali entre vida e morte,
caranguejo ou peixe ou nada
do que seja fraco ou forte
na maré, sua enteada,
mãe segunda que o cativa,
que como filho o adota,
para a solidão nativa
mar sem porto e sem rota.

O poeta José Chagas nasceu no município de Piancó no estado da Paraíba, mas viveu a maior parte da sua vida no estado do Maranhão. Costuma-se dizer em São Luís que José Chagas foi um poeta paraibano, mas com inspiração maranhense. Toda sua vasta obra está diretamente ligada as coisas do Maranhão. Nascer é um ato meramente circunstancial. 

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