Diz-se
que, em política, a palavra é mais da metade da ação. E a palavra, embora
escrita, nunca é ausente de som. Falar, transmitir idéias, defender atitudes,
predicar, convencer fazem parte do cotidiano de um bom político. Assim, o
silêncio seria a antítese da atividade política. Mas nem sempre é desse modo.
Há momentos em que é de grande sabedoria o brocardo popular: “O silêncio é de
ouro”.
Os
livros sagrados estão cheios de recomendações sobre o “guardar a língua”,
afastando o perigo de pecar por “pensamentos” e “palavras”.
O
político que, nos tempos modernos, melhor utilizou o silêncio foi Mitterrand. O
velho combatente socialista, obstinado e firme, falava pouco. Nunca nenhum
presidente francês foi tão avaro de declarações como ele. Achava que só podia
usar a palavra quando ela gerava consequência. Administrou o silêncio com
tamanha maestria que os seus momentos mais criativos e eloquentes foram aqueles
em que ficou calado.
Jânio
Quadros falava o necessário e geralmente para esconder o que pensava. Certa
noite, estávamos em São Paulo, no hotel Cambridge, e ele fazia uma avaliação da
campanha presidencial de 1960. Concluiu que alguns líderes estavam falando
demais e citou Carlos Lacerda. Emílio Carlos, fora da conversa, informou que
Lacerda estava com problema na coluna, exatamente “bico-de-papagaio”. Jânio
repicou: “Ele está é com papagaio no bico”.
Costa
e Silva, ao encontrar-se com o presidente Nixon, depois dos cumprimentos
formais ficou calado, em grande silêncio. Um assessor perguntou-lhe preocupado:
“O senhor está sentindo alguma coisa, presidente?”. “Nada”, respondeu,
bonachão. “É que meu inglês já acabou.”
Romain
Rolland, no seu romance “Jean-Cristophe”, constrói um personagem que possuía
tanta compulsão à tagarelice que só gostava de ir a concertos de Wagner. E
justificava: “A música dele é tão vibrante e alta que a gente pode conversar no
teatro e ninguém nota”.
Na
literatura, a tagarelice é o barroco, a extensão das formas, o exercício dos
detalhes a escrever sempre com um simpósio de adjetivos.
Depois,
surgiu um novo estilo do anti-silêncio na política, a negação do Mitterrand:
era Bush, o texano novo. Falava e dizia tanta bobagem que os seus marqueteiros
criaram uma campanha de imagem na qual ele devia afirmar-se por gafes e,
valha-nos Deus, com erros de inglês e de geografia. Era uma técnica de
imunização à tolice, a busca de uma fórmula eficaz da “auto-anulação”. Vejamos
esta preciosidade de Bush, no Gridirond Club, em contato com a imprensa: “Se
você for rigoroso, vai pensar que o verbo “está” deveria estar no plural,
“estão”. Estou usando o subjuntivo do intransitivo plural. Portanto a palavra
“está” estão correta!”. Shakespeare deve tremer na cova!
É uma
grande virtude saber escutar o silêncio. Há cinquenta anos no Congresso,
cheguei à conclusão de que ali deve ser, hoje, lugar de muito ouvir e de pouco
falar.
por José
Sarney
Este artigo foi publicado originalmente no jornal Diário do Amapá.
Siga o blog Dom Severino no Twitter, no Facebook e no Portalaz
Este artigo foi publicado originalmente no jornal Diário do Amapá.
Siga o blog Dom Severino no Twitter, no Facebook e no Portalaz
Nenhum comentário:
Postar um comentário