sexta-feira, 7 de dezembro de 2018

A poesia segundo José Chagas

I

Olhe aí a palafita
crescendo sobre a maré.
O homem que nela habita
caranguejo ou peixe é.

Caranguejo que se irmana
com os bichos dos lamaçais,
na condição desumana
de caminhar para trás,

de voltar à pré-história,
- vergonhosa marcha à ré -
e afogar sua memória
no ir e vir da maré.

Peixe caído na rede
que a vida lançou ao mangue,
para matar fome e sede
de um mundo nutrido em sangue.

Caranguejo ou peixe, o fato
é que o homem posto na lama
não sabe o seu nome exato
e também ninguém o chama,

nem o batiza de novo
com esse sal de maré.
Não se sabe de que povo
nem de que raça ele é,

ali entre vida e morte,
caranguejo ou peixe ou nada
do que seja fraco ou forte
na maré, sua enteada,

mãe segunda que o cativa,
que como filho o adota,
para a solidão nativa
mar sem porto e sem rota.

José Francisco das Chagas nasceu em Piancó, Paraíba, em 29 de outubro de 1924. Poeta, jornalista, membro da Academia Maranhense de Letras. Autor de muitos livros de poesia, destacando-se Os canhões do silêncio

Siga os blogs Diário do Homem Americano e Dom Severino no Twitter, no Facebook e no Google.

Nenhum comentário: