domingo, 14 de novembro de 2021

A poesia segundo José Chagas

 

I

 

Olhe aí a palafita

crescendo sobre a maré.

O homem que nela habita

caranguejo ou peixe é.

 

Caranguejo que se irmana

com os bichos dos lamaçais,

na condição desumana

de caminhar para trás,

 

de voltar à pré-história,

- vergonhosa marcha à ré -

e afogar sua memória

no ir e vir da maré.

 

Peixe caído na rede

que a vida lançou ao mangue,

para matar fome e sede

de um mundo nutrido em sangue.

 

Caranguejo ou peixe, o fato

é que o homem posto na lama

não sabe o seu nome exato

e também ninguém o chama,

 

nem o batiza de novo

com esse sal de maré.

Não se sabe de que povo

nem de que raça ele é,

 

ali entre vida e morte,

caranguejo ou peixe ou nada

do que seja fraco ou forte

na maré, sua enteada,

 

mãe segunda que o cativa,

que como filho o adota,

para a solidão nativa

mar sem porto e sem rota.

 

José Chagas foi um poeta paraibano

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