Maré Memória
I
Olhe aí a
palafita
crescendo sobre a maré.
O homem que nela habita
caranguejo ou peixe é.
Caranguejo
que se irmana
com os bichos dos lamaçais,
na condição desumana
de caminhar para trás,
de voltar à
pré-história,
– vergonhosa marcha à ré –
e afogar sua memória
no ir e vir da maré.
Peixe caído
na rede
que a vida lançou ao mangue,
para matar fome e sede
de um mundo nutrido em sangue.
Caranguejo ou
peixe, o fato
é que o homem posto na lama
não sabe o seu nome exato
e também ninguém o chama,
nem o batiza
de novo
com esse sal de maré.
Não se sabe de que povo
nem de que raça ele é,
ali entre
vida e morte,
caranguejo ou peixe ou nada
do que seja fraco ou forte
na maré, sua enteada,
mãe segunda
que o cativa,
que como filho o adota,
para a solidão nativa
mar sem porto e sem rota.
José Francisco das Chagas (José Chagas, simplesmente) nasceu em Piancó, Paraíba, em 29 de outubro de 1924. Poeta, jornalista, membro da Academia Maranhense de Letras.
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