terça-feira, 17 de março de 2009

A poesia de Laura Amélia Damous

Exercício

Tuas mãos desenham
uma estranha geometria
curvas que se encontram retas
em direção a um equacionado desejo


Tato

Corpo
cor
de

rosado
rosa
em
mim
plantado


Em trânsito

Pessoas passam na chuva
Temo pela gota d’água parada
na calçada


Misericórdia

Já não posso dizer
te amo
floresce em minha boca
um punhal

Cimitarra
A lua afiada
decepa
a noite
Estamos órfãos

Memória do Tempo

Brevíssimo verão
frágil e fugaz
perpassa o coração trêmulo e assustado
O outono é a certeza (p.41)

Quiromancia

A mão do poema
é a que me cabe
inteira
A outra
eu a carrego,
pesada e alheia

Noturno

Tudo é tão simples
que poderia ser pedra

Ratoeira

Tremo em pensar
que a saída
vai dar em tua boca



OFERENDA


Venho te oferecer meu coração

como o cansaço se oferece aos amantes

o suor aos corpos exaustos

depois de definitivo abraço

Venho te oferecer meu coração

como a lua se oferece à noite

e o vento à tempestade

Venho te oferecer meu coração

como o peixe se oferece à captura

no engano do anzol


TORRES DA SÉ


Garças altivas beliscam

o céu

sangram estrelas

que se desfazem em luz

noites azuis

de maré alta

orquestram hinos e preces

minha cidade faz

o sinal da cruz

adormece


Laura Amélia Damous - nasceu em Turiaçú, no Maranhão, em 1945 mas seu primeiro livro só é publicado em 1985 – Brevíssima canção do amor constante.

“Obra pequena, mas significativa como ser poético, ela não se parece com nenhum de seus contemporâneos maranhenses, linguagem sintética de um cancioneiro peculiar, ao gosto dos ideogramas japoneses. No Brasil, a sua referência maior seria a Cecília Meireles das Canções, a mesma espontaneidade e rigor ao construir os poemas.” ASSIS BRASIL

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