quinta-feira, 1 de julho de 2010

Entrevista com o vice de José Serrra

O deputado federal Indio da Costa (DEM-RJ) poderia ficar tranqüilo, na “zona do conforto”, como diz uma propaganda sobre os craques da Seleção, e esperar a reeleição para a Câmara. Em política, quando se tem 39 anos, tempo não é problema. Mas decidiu suar a camisa para valer e aceitou o desafio de ser o vice na chapa encabeçada pelo presidenciável tucano, José Serra. Surgiu como um nome de consenso de tucanos e democratas depois da crise danada envolvendo os dois partidos. Sem trocadilho, Indio afirma: “Volto a pintar a cara para eleger José Serra presidente do Brasil”.

Ele faz alusão ao movimento dos cara-pintadas, de 1992, que, se não derrubou exatamente o então presidente Fernando Collor — hoje aliado de Lula —, serviu para informar ao Congresso, à Justiça e ao próprio chefe do Executivo qual era o sentimento da sociedade. Indio da Costa, então com 22 anos, também foi às ruas. E acha que alguns daqueles anseios acabaram se perdendo ou foram pervertidos. O que faz Indio pintar a cara 18 anos depois? “O inchaço da máquina pública, o apadrinhamento dos incompetentes, o aparelhamento do Estado, o uso partidário da máquina pública, a baixa qualidade dos serviços do Estado”.
Advogado, membro de uma família tradicional do Rio, sem histórias tristes para contar sobre a infância sofrida, com uma carreira na vida privada, se quisesse, que poderia se dar sem sobressaltos… Por que alguém com esse perfil vai para a política? Ele responde: “Paixão por algumas causas e apreço pelas pessoas”.

O candidato a vice de Serra conta que teve um aneurisma cerebral em 2003. Achou que fosse morrer. Sobreviveu. Se tirou lições existenciais, não diz, mas ele tirou uma lição política: “Quando eu me recuperei, tive renovada a certeza de que é preciso lutar para que todas as pessoas tenham as condições de tratamento que eu tive.” Diz ainda: “Não é possível passar diante de um hospital público, ver aquela fila imensa, saber que as pessoas estão sendo maltratadas e achar que aquilo é normal.”

Perguntei se juventude ajuda ou atrapalha. Sorrindo, ele afirma: “Se for um defeito, tem cura!” Ô… Taí um mal que poderia ser incurável, hehe. Seguem os principais trechos da entrevista, concedida ontem à noite a este blog por telefone.
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BLOG - Por que o senhor é um bom candidato a vice-presidente na chapa encabeçada pelo tucano José Serra?
INDIO DA COSTA -
Bem, o Democratas e o próprio José Serra talvez possam dizer melhor do que eu. Mas é certo que contou nessa escolha a minha atuação no Projeto Ficha Limpa, do qual fui relator. É bom lembrar, as reportagens estão por aí, que, inicialmente, os líderes do governo, do PT, PMDB, PP e PR na Câmara se juntaram contra a proposta. Foi preciso muita determinação nossa, do PSDB, do DEM e do PPS, para levar adiante o que era um anseio muito justo da população. Ela não tem como saber, sozinha, a situação criminal de muitos candidatos. É preciso que o Estado crie barreiras e forneça os instrumentos para impedir que a política seja contaminada por práticas nefastas. Uma pessoa condenada não pode usar a imunidade oferecida pelo mandato para se proteger. Essa sempre foi a minha crença, desde que estou na política, e era e é esse o sentido primário do projeto Ficha Limpa.

BLOG - O senhor tem 39 anos. Vai fazer 40 no mês da eleição (dia 20 de outubro). Nesse caso, juventude ajuda ou atrapalha?
INDIO DA COSTA -
Se a juventude é um defeito, é daqueles defeitos que têm cura (risos). E também não sou tão jovem assim. Estou há 18 anos na política. Mas reconheço que há uma marca de renovação. E me junto a José Serra, que me parece o retrato da experiência, do conhecimento, da competência. Não quero fazer disso que chamam juventude uma vantagem absoluta, mas represento um modo de fazer política que está bastante conectado com anseios coletivos, que nem sempre encontram canais de expressão. Entre as assinaturas de Internet e de papel, o Projeto Ficha Limpa teve a adesão de 4,2 milhões de pessoas. E elas conseguiram se fazer ouvir, representando, certamente, muito mais gente do que isso.

BLOG - Dezoito anos na política? Em 1992, houve o chamado movimento dos cara-pintadas, que pediram a deposição do então presidente Fernando Collor. O senhor foi à rua pedir o impeachment?
INDIO DA COSTA -
Fui, sim. Eu fui um cara-pintada. Não era ligado a nenhum movimento propriamente, mas fui às ruas como muita gente.

BLOG - Acredita que aqueles anseios foram satisfeitos?
INDIO DA COSTA -
Não fui às ruas para eleger ninguém. Foi um movimento exigindo ética na política. E hoje pinto a cara novamente, agora para eleger José Serra presidente da República.

BLOG - Qual é a causa de agora? Continua a ser a questão ética?
INDIO DA COSTA -
Também é, ou não precisaríamos de um projeto como o Ficha Limpa. Mas a pauta é mais ampla. É preciso pintar a cara contra o inchaço da máquina pública, contra o apadrinhamento dos incompetentes, contra o aparelhamento do Estado, contra o uso partidário da máquina pública, contra a baixa qualidade dos serviços. Mas é preciso pintar a cara também a favor: a favor de um modelo em que o estado seja realmente indutor do desenvolvimento, não um patrão da sociedade, que quer concorrer com ela. Há muita coisa a fazer no Brasil.

BLOG - O sr. tem uma origem familiar que lhe permitira cuidar de sua vida privada sem se meter no território às vezes hostil da política. Por que essa escolha?
INDIO DA COSTA -
Alguns dirão que é piegas, mas é verdade: é paixão mesmo. Paixão por algumas causas e apreço pelas pessoas. Não é possível passar diante de um hospital público, ver aquela fila imensa, saber que as pessoas estão sendo maltratadas e achar que aquilo é normal. Não é.  Não dá para constatar que a gente tem uma educação de baixa performance, uma das piores do mundo, e considerar que as coisas são assim mesmo, que a gente, como povo, é assim. É preciso melhorar essas políticas públicas. Não é preciso ver a tragédia social decorrente de catástrofes naturais e achar que nada pode ser feito. É a política que tem de mudar essas realidades.

BLOG - O sr. fez uma cirurgia delicada em 2003 para extrair um aneurisma do cérebro. Ficou com medo de morrer?
INDIO DA COSTA -
Eu tinha 32 anos. Pensei na morte. Mas, felizmente, tudo deu certo. Não quero falar de lições existenciais que aprendi, porque isso é muito pessoal, mas não deixo de agradecer a Deus, à minha família e aos doutores Paulo Niemeyer e Sérgio Novis, que cuidaram de mim. Quando eu me recuperei, tive renovada a certeza de que é preciso lutar para que todas as pessoas tenham as condições de tratamento que eu tive. E a questão não se limita à saúde. Já colocamos todas as crianças na escola? Praticamente. Mas como anda a qualidade? É preciso cuidar da capacitação técnica dos brasileiros, e desde a primeira infância. E as creches? Com apoio do Congresso, o atual governo transformou o Fundef no Fundeb, mas faltam creches; os recursos não chegam, param na burocracia. Temos desafios imensos. E é, sim, a política que cuida dessas coisas. É por isso que precisa ser exercida por pessoas de bem e com a consciência limpa. A oportunidade de ser vice do Serra - acredito na vitória - dá a chance de a gente acelerar as transformações, de fazer mais. Aprendi muito como vereador, como deputado federal, mas sabemos o peso que o Executivo tem no Brasil e como ele pode ser efetivo para mudar a realidade quando a proposta é boa. Lembro, na prática, quando fui administrador de Copacabana, em 1995, e secretário de Administração da Prefeitura do Rio, entre 2001 e 2006, da força que tem o Executivo para transformar a vida das pessoas.

BLOG - O que há de melhor e o que há de pior no governo Lula?
INDIO DA COSTA -
O melhor é que eles não mexeram nos marcos essenciais da estabilidade econômica. E o pior está num processo de mediocrização, de desprezo pelo mérito. O pior está em recorrer a métodos detestáveis para manter o poder, de que o mensalão foi um exemplo escandaloso. Não se distinguem as esferas do estado, do governo propriamente, do aparato sindical e do partido. Isso não constitui um atentado meramente conceitual à democracia; é uma agressão ao padrão democrático que se dá na prática. Vimos o exemplo do Programa Nacional de Direitos Humanos. Recorreu-se a uma boa causa para tentar emplacar teses autoritárias, que, entre outras barbaridades, atentam claramente contra a livre iniciativa e a liberdade de imprensa.

BLOG - O senhor é conhecido por ser um deputado ligado à causa do meio ambiente. Essa causa se choca, em algum momento, com a agricultura e a pecuária?
INDIO DA COSTA -
Defendo a vida. Com a tecnologia existente, podemos produzir mais e melhor. O setor rural brasileiro é fundamental para a vida das pessoas que precisam se alimentar, ter emprego e renda. O produtor rural não é inimigo; o desmatador sim. É perfeitamente possível chegar a um padrão de racionalidade ambiental que proteja o meio ambiente e garanta o vigor do Brasil na agricultura e na pecuária. Defendo que as empresas verdes sejam incentivadas de todas as formas e que se busquem novas formas de geração de energia limpa, o transporte sobre trilhos e uma produção rural que alie a produtividade com o meio ambiente. É possível.

BLOG - O sr. está animado? O Serra vai acordar o senhor de madrugada…
INDIO DA COSTA -
Pode acordar (risos). Eu estou muito animado, sim. Perto de fazer 40 anos, trabalhar com uma das pessoas que mais entendem de administração e políticas públicas no Brasil é um privilégio pessoal, sem dúvida, me orgulha bastante. Mas me dá, sobretudo, ânimo para realmente demonstrar que é possível fazer muito mais em favor das pessoas, oferecendo instrumentos que as tirem da miséria de forma efetiva, não demagógica. E vamos conseguir! (entrevista concedida ao jornalista Reinadlo Azevedo - da Veja.com)

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