segunda-feira, 26 de julho de 2010

A poesia segundo Ferreira Gullar

A Poeisa

Ferreira Gullar

Onde está
a poesia? Indaga-se
por toda parte. E a poesia
vai à esquina comprar jornal.

Cientistas esquartejam Puchkin e Baudelaire.
Exegetas desmontam a máquina da linguagem.
A poesia ri.

Baixa-se uma portaria: é proibido
misturar o poema com Ipanema.
O poeta depõe no inquérito:
Meu poema é puro, flor
Sem haste, juro!

Não tem passado nem futuro.
Não sabe a fel nem sabe a mel:
É de papel.

Não é como a açucena
Que efêmera
Passa.
E não está sujeito a traça
Pois tem a proteção do inseticida.
Creia,
O meu poema está infenso à vida.

Claro, a vida é suja, a vida é dura.
E sobretudo insegura:
.........“Suspeito de atividades subversivas foi detido ontem
.........o poeta Casimiro de Abreu.”
.........“A Fábrica de Fiação Camboa abriu falência e deixou
.........sem emprego uma centena de operários.”
...... ..“A adúltera Rosa Gonçalves, depondo na 3ª Vara de Família,
...... ...afirmou descaradamente: ‘Traí ele, sim. O amor acaba, seu juiz.’”


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