Guaraná sem gás e carne de bode
Pimentel é um ministro elegante, não vocifera como seu colega das Cidades. Mas seu caso também não cheira bem
Por que a
Eta Bebidas do Nordeste, uma fabriqueta de guaraná em copo, não gaseificado,
com sede em Pernambuco, pagou R$ 130 mil de consultoria a Fernando Pimentel?
Por que a Eta negou o contrato e, no dia seguinte, voltou atrás? O que Pimentel
sugeriu como estratégia, já que a fábrica está em processo de liquidação? Por
que o superconsultor Pimentel resolveu dar um gás numa bebida de R$ 0,50 que
fazia propaganda no Ratinho e contratava meninas em jogo do Sport com o Santa
Cruz?
Afinal, ele assessorava a Federação das Indústrias de Minas e os
consórcios de construtoras que farão obras na Copa.
Eta
ferro, ministro. Olhando de fora, nada disso parece fazer o menor sentido em
seu currículo. Mas Pimentel acha que faz, como afirmou a ÉPOCA (leia a
entrevista).
Entendo que, “para sobreviver”, a consultoria privada fosse o
caminho óbvio para quem estava fora do poder formal, em 2009 e 2010. Entendo
que tenha recebido R$ 2 milhões (declarados) em pouco menos de dois anos. Seu
passe era alto. Pimentel não era um desempregado qualquer. Ele coordenava a
campanha da conterrânea mineira, candidata de Lula à Presidência. Era candidato
ao Senado pelo PT. Tinha sido prefeito de Belo Horizonte e aliado de Aécio
Neves na coalizão mineira.
Pimentel
é um ministro elegante. É peso-pesado, por ser tão próximo de Dilma, desde os
tempos de luta em que a presidente tinha aquela carinha bonita da foto que
ÉPOCA divulgou na semana passada. Ele não vocifera. Não esbraveja. Não chora em
público como outro colega ameaçado, Mário Negromonte, das Cidades, que se gaba
de ter comido “muita carne de bode”. Não se mete com festas em motéis, não
constrange Dilma com declarações de amor. Tem mais classe que o bloco dos
destituídos de 2011.
Se algo
emerge dos escândalos, é o baixo nível do alto escalão. Enquanto os ministros
estavam ali quietinhos no Planalto, mamando nas tetas do país, sem dar
entrevista, não se imaginava que eles mal soubessem falar. São esses
personagens os mais altos representantes do governo brasileiro? Depois há quem
reclame que a presidente perca a paciência.
Pimentel
é um ministro elegante, não vocifera como seu colega das Cidades. Mas seu caso
também não cheira bem.
Pimentel
não silenciou sobre seus clientes de consultoria como Palocci, o enigmático
ex-chefe da Casa Civil que entrou mudo e saiu calado. Não foi acusado, como
Rossi, da Agricultura, de contratar lobista nem bandido para sua pasta. Não
pesam contra ele denúncias de desvio de dinheiro público, propinas ou convênios
irregulares com ONGs. Assim foram derrubados Nascimento, dos Transportes,
Novais, do Turismo, Silva, do Esporte, e Lupi, do Trabalho. Ufa!
O que
poderia tirar Pimentel do bichado ministério de Dilma é algo mais sutil.
Chama-se tráfico de influência. É aquele terreno pantanoso das relações entre o
poder público e o capital privado. Até agora, nada do que foi levantado contra
Pimentel é ilegal, por não ter sido praticado no exercício do cargo. Não o
ajuda, porém, o pedido de demissão de seu ex-sócio na empresa de consultoria,
Otílio Prado, que continuava como assessor especial do prefeito de Belo
Horizonte, Márcio Lacerda. Otílio se sente culpado de quê? Também não é bom
para Pimentel que sua empresa de consultoria continue aberta, embora inativa.
Mas, se nada de mais grave surgir, dificilmente ele cairá. Pimentel está na
cota de Dilma. Ela vai protegê-lo.
O
problema deixou de ser Pimentel ou Negromonte. Há uma desconfiança geral no
sistema. Quando o governo federal precisa explicar por escrito aos Estados que
verba de Saúde tem de ser gasta na Saúde, e não desviada para outros fins.
Quando o líder do governo na Câmara, Candido Vaccarezza, acha a coisa mais
normal do mundo ser “funcionário fantasma” e não aparecer para trabalhar.
Quando políticos não veem nada antiético em embarcar em jatos de empresários ou
comprar votos. Quando o mérito deixa de ser um critério e perde para o
apadrinhamento. Quando nada acontece com corruptos.
O povo
não quer mais pagar pela farra pública, presidente Dilma. A Câmara prepara
aumentos de R$ 386 milhões. O que fazem os 10 mil secretários parlamentares nos
gabinetes da Câmara? O que faz essa gente? São 1.200 cargos especiais, com
salários de até R$ 12 mil. A verba de gabinete de cada deputado é de R$ 60 mil
por mês e pode subir para R$ 90 mil. Como se justifica isso para o contribuinte?
Por que essas pessoas podem aprovar aumentos para si mesmas com nosso dinheiro?
Como,
numa recessão mundial, o Executivo poderá manter 39 ministérios e 23.500
assessores de confiança? Dilma, se sua maior qualidade for mesmo a gestão
responsável, aí está a oportunidade de fazer história – e não só faxina. Fonte: Revista Época
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