quinta-feira, 15 de março de 2018

A poesia segundo José Chagas



I

Olhe aí a palafita
crescendo sobre a maré.
O homem que nela habita
caranguejo ou peixe é.

Caranguejo que se irmana
com os bichos dos lamaçais,
na condição desumana
de caminhar para trás,

de voltar à pré-história,
- vergonhosa marcha à ré -
e afogar sua memória
no ir e vir da maré.

Peixe caído na rede
que a vida lançou ao mangue,
para matar fome e sede
de um mundo nutrido em sangue.

Caranguejo ou peixe, o fato
é que o homem posto na lama
não sabe o seu nome exato
e também ninguém o chama,

nem o batiza de novo
com esse sal de maré.
Não se sabe de que povo
nem de que raça ele é,

ali entre vida e morte,
caranguejo ou peixe ou nada
do que seja fraco ou forte
na maré, sua enteada,

mãe segunda que o cativa,
que como filho o adota,
para a solidão nativa
mar sem porto e sem rota.

José Francisco das Chagas nasceu em Piancó, Paraíba, em 29 de outubro de 1924. Poeta, jornalista, membro da Academia Maranhense de Letras (AML).

Nenhum comentário: