Indagações do vento
Ossos do Guevara:
— esqueleto do sonho?
natureza rara
de assombro medonho?
Ideais sepultos
que brotam de novo?
revide aos insultos
que sofreu o povo?
Soturna guerrilha
que o mundo reclama
pensando que brilha,
já não sendo chama?
Será brasa viva
a arder o futuro?
Cinza que se ativa,
fogo de monturo?
Será que a ossada
de Che ainda aduba
a terra encharcada
do sangue de Cuba?
Que cães vão em
busca
desses ossos dúbios,
ao sol que hoje ofusca
tão falsos conúbios?
A alma latina
nasce desses ossos,
como o que germina
dos estrumes nossos?
Será que esse mito
que do chão renasce
fará o infinito
encarar sua face?
Será que ele é
visto
como um santo novo,
ou num neocristo
na reza do povo?
Pode um morto só
nos dar esperança, a
o fazer-se pó
que ao vento se lança?
E o que o vento
indaga
ganhará resposta,
ou somente a praga
da verdade exposta?
Um herói em osso
mantém seu tutano,
em meio ao destroço
do destino humano?
Posto assim Guevara
nos ossos do ofício,
a morte o declara
pronto ao sacrifício?
Seu caminho torto
será que ainda alcança
o perdido porto
de sua esperança?
Ossos do
Guevara:
— quem é tão fecundo
que os toma e prepara
a sopa do mundo?
José Francisco das Chagas nasceu em Piancó, Paraíba, em 29 de outubro de 1924. Poeta, jornalista, membro da Academia Maranhense de Letras (AML).
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