por John Cutrim (Jornal Pequeno)
Caros colegas, amigos, companheiros,
É muito difícil escrever nestas horas, quando ainda não conseguimos processar o impacto do pronunciamento dos ministros do Supremo Tribunal Eleitoral em favor da cassação do Governador Jackson Lago. Porém, mais difícil seria ficar com estas palavras e esta emoção guardadas dentro de mim sem partilhá-las com vocês.
Aconteceu na madrugada de hoje (04) o que muitos temiamos, mas não nos animávamos a dizer com toda a clareza que a gravidade do caso exigia, porque eram tão imprevisíveis e nefastos os desdobramentos que evitávamos nos debruçar diante de um cenário tão desesperador.
Mas aconteceu. E temos que avaliar a situação.
Apesar da (aparentemente) irrefutável defesa dos advogados do Dr. Jackson – e aqui queiro deixar expressa a minha admiração pela brilhante e comovente arguição do Dr. Francisco Resek e pela coragem com que colocou algumas verdades que o caso revela – a maioria dos ministros do Tribunal Superior Eleitoral acolheu a versão da coligação “Maranhão - a Força do Povo”, que apoiou a candidata Roseana Sarney nas eleições de 2006. Em consequencia disso, cassou o mandato do governador Jackson Lago e do vice–governador, Luis Carlos Porto. E mais, determinou a toma de posse da candidata derrotada.
O Dr. Resek mostrou na sua intervenção as implicações de uma decisão como essa. Adiantava-se, assim, ao que veio acontecer. Mostrou que o Maranhão poderia ser levado ao caos, pois a candidatura de Roseana Sarney vem sendo objeto de processo judicial. A imprensa já tem noticiado a respeito das investigações da polícia e do Ministério Público sobre as ilegalidades no financiamento da sua campanha, cujo principal responsável era Fernando Sarney.
Também mostrou o Dr. Resek que esse grupo vinha mantendo o seu poder graças a uma forma autoritária de controle do Estado e ao controle das principais emissoras de rádio e de televisão e do maior jornal do Maranhão.
O próprio advogado de defesa de Roseana Sarney, Dr. Sepúlveda Pertence, e depois também o presidente do Tribunal, Dr. Ayres Britto, fizeram uso de uma frase que teria sido proferida pelo então governador José Reinaldo Tavares: “por primeira vez essa família está tendo contra si a máquina do Estado”. Essa frase indicaria, alegaram, a confisão, do próprio ex-Governador, do uso da máquina do Estado em favor dos candidatos adversários de Roseana Sarney. Mas, na leitura dos magistrados “escapou” o sentido implícito da frase de Reinaldo Tavares: desde a redemocratização, a família Sarney conseguiu a vitória dos seus candidatos com uso e abuso da máquina do Estado!
Na justificativa de seu voto, o Dr. Ayres Britto alegou que a Constituição coloca para a posse de um cargo majoritário a necessidade de maioria de votos e de lisura na eleição. Parece irrefutável o raciocínio. Porém, esse voto defendia a cassação do Dr. Jackson Lago e, a seguir, a entrega do cargo a Roseana Sarney. Que interpretação sui-generis da letra da lei! Totalmente descontextualizada! E ainda utilizada para entregar o cargo a quem em 40 anos demonstradamente utilizou a máquina pública – e a própria justiça! - para ganhar eleições sem nenhuma lisura e tirar o cargo de quem lutou contra isso!
Que desespero para todos nós, que tanto acreditamos na democracia, ver o quanto ainda estamos longe neste país desse sistema de governo que hoje parece só uma utopia!
A cada dia temos mais claras demonstrações de que a ditadura brasileira deixou o espaço político e jurídico minado com bombas de efeito retardado, que ainda hoje fazem estragos! Não só não foi uma “ditabranda” como cumpriu o seu papel com brilhantismo: assegurou que mais de vinte anos depois de promulgada a que foi chamada de “Constituição cidadã” - que assegura a todos os homens e mulheres a igualdade de direitos e deveres – uns sejam mais iguais que outros! E que os privilégios de poucos continuem em detrimento dos anseios da maioria.
As mesmas elites que foram bater na porta dos quartéis quando o governo João Goulart começava a implementar medidas que ameaçavam a sua supremacia, hoje se utilizam do aparato do Estado para – ao amparo da Justiça e dos grandes meios de comunicação – violentar o espírito da nossa Carta maior. Que longe estamos do sonho democrático!
E o que fazer, diante dessa constatação?
Naturalmente devemos percorrer todos os caminhos legais que temos ao alcance para tentar fazer Justiça (com maiúscula!) E ficarmos mobilizados!
É o nosso direito mostrar a insatisfação diante da injustiça! É o nosso direito mostrar a insatisfação diante do poder dos grandes meios de comunicação, em permanente conspiração contra os valores democráticos e contra as maiorias! É o nosso direito protestar! É o nosso direito ganhar as ruas com as nossas mensagens! Esse espaço é o único que temos! Foi conquistado e não abriremos mão dele!
Enterraríamos os sonhos de gerações que lutaram e deram a vida pela democracia e pela justiça social se nos deixarmos abater pela aparente derrota. O povo brasileiro está dando demonstrações inequívocas de que não aceita mais que os Collors de Mello, os Sarneys, os Calheiros voltem ao cenário como atores de primeira linha!
É necessário demonstrar que no Brasil de 2009, no Brasil de 2010, 2011, 2012, no Brasil de hoje e de amanhã, não há mais espaço para eles!
Se não formos capazes de dar ao povo a esperança de que o voto efetivamente tem valor, de que a Justiça pode ser confiável, de que a lei pode efetivamente ser igual para todos, estaremos diante de um cenário assustador: um povo desiludido e desesperançado, um povo sem verdadeiros canais de participação democrática, a mercê de cantos de sereia salvadores, com o perigo que isso implica. Se o espaço político e institucional continua tomado pela prepotência e pela corrupção, a lei da selva estará instalada entre nós.
Talvez caiba ao povo do Maranhão iniciar a grande transformação que o Brasil está a exigir: a transformação da apatia e do conformismo, do salve-se-quem-puder, da ação desesperada, isolada, em ação positiva, construtiva, coletiva, organizada, enérgica e solidária, de um povo que tem dignidade e não se curva perante ninguém, ciente dos seus direitos. O Dr. Jackson Lago disse, após a sua cassação, que a forma que tinha de agradecer ao povo que o acompanhou ao longo de meses de vigília democrática era continuar na luta.
Na luta haveremos de continuar!
Beatriz Bissio, 4 de março de 2009
O TSE cassou o mandato do Governador Jackson Lago. Cabem embargos e recursos, direitos de quem se acha ofendido e injustiçado. A defesa questiona o método utilizado na votação, no plenário do TSE, que provocou confusão e entendimentos diferentes do seu resultado, onde, diga-se de passagem, um resultado essencialmente parcial. Veja, abaixo, o desenho desse processo com o levantamento de alguns questionamentos:
1) Não foi unanimidade a cassação do governador Jackson Lago e seu vice. Esse julgamento foi essencialmente político. A votação não foi de 5 a 2 como a mirante noticiou, mas de 4 a 3. Se assim fosse, não haveria necessidade do voto do presidente Carlos Ayres Brito.
2) O governador Jackson Lago sofreu condenação parcial somente por abuso de poder político. A imputação de compra de votos e abuso de poder econômico foram indeferidos pela maioria dos ministros.
3) O relator do processo, ministro Eros Grau, foi o único a condenar Jackson nas três imputações: abuso de poder econômico, abuso de poder político e compra de votos.
4) Os ministros Marcelo Ribeiro e Arnaldo Versiani votaram direto pela absolvição de Jackson por entenderem que as provas não são suficientes para cassar o mandato do governador e de seu vice.
5) O ministro Felix Fischer listou diversas acusações das quais as provas não convencem, e no final foi confundido seu voto pela cassação. O próprio presidente Ayres Brito entendeu que foi pela absolvição, daí que ele proferiu o seu voto, pois, no seu entendimento, a votação naquela altura estava empatada por 3 a 3.
6) O ministro Ricardo Lewandowski destacou que para caracterizar a captação ilícita é necessária comprovação da atuação direta do candidato, o que não ficou claro no presente caso. Ele observou que a divulgação de convênios e obras não caracteriza ilícito eleitoral e que a participação de Jackson Lago em comício não caracteriza ilegalidade. Também no caso do convênio celebrado com o povoado Tanque, não há notícias de que tenha sido declarado ilegal pelo Poder Judiciário do estado, tribunal de contas ou qualquer órgão para tanto habilitado, além do que algumas acusações são muito genéricas.
No entanto, Lewandowski ponderou sobre a prisão do motorista do vereador João Menezes Santana Filho, pela Polícia Militar, com R$ 17 mil que seriam utilizados para a compra de votos. Esse fato deu origem ao inquérito policial e foram somados ao processo os depoimentos de cidadãos que teriam vendidos seus votos. Em todas as ocasiões os cidadãos que confessaram terem vendido seus votos afirmaram que foram abordados pelo vereador que ofereceu dinheiro para que votassem em Jackson Lago. Nesse sentido, o ministro se confundiu e contradiz o seu próprio argumento da atuação direta para caracterizar captação ilícita, votando pela cassação por compra de votos. Esse voto poderá ser pela absolvição.
7) O presidente do TSE, ministro Carlos Ayres Brito disse que o então governador José Reinaldo Tavares tinha toda legitimidade para montar em torno de si um aparato e um esquema de corre legionários para combater determinada candidatura tida como representativa de uma oligarquia que perdurava por quatro décadas. Mas, ele entendeu que houve abuso do poder político e votou pela cassação.
8) Se os ministros que votaram pela cassação, fora o relator Eros Grau, não tivessem nenhuma sensibilidade para reconsiderar suas posições, não dariam provimento para a possibilidade de analisarem possíveis mudanças de opiniões. A decisão de ontem do TSE só terá eficácia após o julgamento desses eventuais embargos declaratórios. O próprio ministro Eros Grau, num processo similar a esse de Jackson, reconsiderou o seu voto de relator, que antes era pela cassação de um prefeito de Minas e em dezembro último mudou pela absolvição. É essa matéria que estou trabalhando a mais de um mês, mas não consigo retorno do referido ministro. Irei à Brasília para tentar entrevistá-lo, pois por telefone e mensagens eletrônicas não estou obtendo sucesso.
PS.: Estas conclusões foram sintetizadas a partir de uma entrevista com um dos protagonistas da defesa de Jackson.
9) Por que será que apenas os dois mais jovens ministros votaram contra a cassação?
10) Por que Jackson agora paga pelo abuso eleitoral, se no palanque de Codó ele nem pediu votos?
11) Por que o vídeo de Codó continuou sendo considerado prova se foi um vídeo feito fora do período eleitoral (em março ou abril de 2006), e uma vez que o TSE existe para julgar crimes eleitorais?
12) Por que foi tão confusa a decisão, alguns refutaram o vídeo, afirmando ser até um discurso normal e outros julgaram aquilo o maior abuso de poder econômico?
13) O STF deve atentar para tais fatos com avaliações tão pessoais?
14) Por que o ministro Eros Grau, reagia com visível raiva a quem buscasse apontar outras possíveis versões?
15) Como se explica o fato do TSE cassar o mandato de Jackson por abuso de poder econômico e dar o mandato para Roseana também acusada do mesmo delito?
16) Por que nenhuma das preliminares levantados pelos advogados de Jackson foi aprovada por nenhum dos ministros?
17) Pra que serviu mesmo a exposição oral do ex-presidente do TSE, Sepúlveda Pertence, para dar um momento de emoção ao ex-presidente?
18) Por que nunca levaram em consideração que o presidente da Procuradoria Geral Eleitoral (PGE) e do Ministério Público Federal, Antonio Fernando de Sousa esteve na cidade de Macapá, 12 dias de ser deflagrada a operação navalha?
19) Por último, por quais motivos não levaram em consideração que a PGE deu parecer favorável a não cassação do próprio Sarney por abuso de poder econômico?
Com informações do blogue do Eri Castro e Ricardo Santos
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