por Pablo Uchoa
Enquanto o corpo do presidente venezuelano, Hugo Chávez, repousar em um caixão de cristal em seu costumeiro uniforme militar e boina vermelha, uma espécie de ''bandeira branca'' paira sobre um dos ambientes políticos mais polarizados do hemisfério.
Engana-se, entretanto, quem imaginar que a política permanece suspensa na Venezuela enquanto os simpatizantes de Hugo Chávez lamentam a perda do seu líder.
E após o anúncio de que o corpo do bolivariano será embalsamado e permanecerá em exibição por pelo menos mais sete dias, político é também o despontar do ''mito'' Chávez, cujo legado político no curto prazo será dificultar a vida de uma oposição que tentará sua sorte mais uma vez nas eleições que se avizinham.Políticas, tanto quanto humanas, são as filas quilométricas que venezuelanos de todas as partes do país enfrentam por 6, 8, 10 horas sob sol a pino pelo privilégio de ver, por meros segundos, o rosto de Chávez ao vivo pela última vez.
Os oposicionistas já enfrentavam a questão abstrata de como lutar contra o último pedido aos eleitores feito pelo ''mito'' em vida: o de que o substituíssem pelo atual presidente interino, Nicolás Maduro.
Agora, há a questão mais mundana de como acionar o modo de campanha tendo como principal plataforma a crítica a um morto que nem sequer foi enterrado ainda.
Último desejo
''Há pouco que a oposição possa fazer para mudar isso'', disse à BBC Brasil o sócio da consultoria Datanálisis, o analista político Luis Vicente León. ''O povo está nas ruas aos milhões, não foi uma invenção do chavismo.''
O consultor acredita que foi um erro inicial do governo permitir apenas três dias para acomodar todas as visitações ao caixão de Chávez.
Compara a situação a um livro ''que você publica em tiragem pequena porque acredita que não vai vender muito, e por alguma razão o livro faz sucesso e se esgota rapidamente''.
De todo modo, avalia León, ''agora fica difícil para o governo impedir que a população tenha contato com um líder com a relação popular que Chávez tinha''.
A oposição vinha aguardando o fim das homenagens a Chávez para confirmar a candidatura de Henrique Capriles Radonski, derrotado pelo presidente nas eleições de outubro, na ''revanche'' com o chavismo.
No ínterim, a ''bandeira branca'' virtual da política venezuelana significou que a tradicional mordacidade estampada nas páginas dos jornais e canais de TV simpáticos à oposição desse lugar ao respeito pela dor alheia.
Os dirigentes dos partidos antichavistas têm mantido a discrição, se não pelo mesmo motivo, para evitar declarações em falso que ponham risco seu apoio popular a semanas do pleito eleitoral.
Tom ameno
Portanto, mesmo considerando que a oposição sai perdendo com a extensão das homenagens a Chávez, muitos analistas creem que a melhor estratégia, para os oposicionistas, seja manter a ''bandeira branca'' hasteada.
Em uma das raras manifestações sobre a mudança na quarta-feira, o presidente editor do diário El Nacional, de oposição e um dos mais poderosos grupos de comunicação do país, disse esperar que, após o luto por Chávez, a sociedade venezuelana encontre o caminho do "diálogo" e da "paz".
Evitando criticar a decisão de estender as homenagens ao bolivariano, Miguel Enrique Otero preferiu ressaltar que os chamamentos à paz e ao diálogo vieram tanto do governo quanto da oposição.
''Isto quer dizer que no futuro imediato abriu-se a possibilidade de que um primeiro avanço do período pós-chavismo seja a restituição da conversa entre o governo e a sociedade'', argumentou o empresário. Fonte: BBC Brasil

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